por J. U. Jacoby Fernandes
No diário oficial de hoje, dia 11 de janeiro, foram publicadas algumas razões de veto a projetos de lei aprovados pelo Congresso Nacional. Duas situações chamam a atenção.1
A primeira refere-se ao Projeto de Lei no 1.530, de 2015 (nº 8/18 no Senado Federal), que “Dispõe sobre medidas de prevenção e repressão ao contrabando, ao descaminho, ao furto, ao roubo e à receptação.”
Mas essa norma ia além: impunha a perda do CNPJ. Nas razões do veto, não foram lançadas observações sobre a dificuldade que adviria à pretensão de pagamento de impostos pelo próprio infrator. Sem CNPJ, o crédito pago espontaneamente seria lançado em favor de qual contribuinte?
O outro veto foi integral, por inconstitucionalidade, ao Projeto de Lei no 1.681, de 1999 (nº 187/08 no Senado Federal), que “regula o exercício da profissão de técnico em imobilizações ortopédicas”. Também se fez no caminho certo, pois a definição de novas profissões e a vedação ao exercício de atividades reguladas a terceiros deve ser feita com cautela.
A proliferação de profissões implica em vetor oposto à vedação ao exercício de outros cidadãos e profissionais por essa atividade. A Constituição brasileira determina no art. 5º, como um dos direitos fundamentais:
XIII – é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;
A discussão sobre o tema – profissão regulamentada versus liberdade de exercício profissional – encontra-se na atualidade balizado por várias decisões do Supremo Tribunal Federal, entre as quais: Vide ADI 5.035 e 5.037, rel. p/ o ac. Alexandre Moraes, Inf. 886; ADI 3.541, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 24/03/2014; ADI 3.000, Rel. Min. Carlos Velloso, Informativo 413; ADI 1.040, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 01/04/2005; ADI 1.717, Rel. Min. Sydney Sanches, DJ 28/03/2003; ADI 1.723-MC, voto do Min. Carlos Velloso, DJ 19/12/2001; ADI 2.317-MC, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 23/03/2001 e ADI 1.062-MC, Rel. Min. Sydney Sanches, DJ 01/07/94; ADI 803, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 23/11/2017; ADI 395, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJ 17/08/2007. Em especial, na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 803-0 – Distrito Federal. (medida liminar) em que foi Relator o senhor Ministro Octavio Gallotti. Essa ação firmou o entendimento de que ao definir uma profissão, insere-se um elenco de atividades privativas, às vezes restringindo outras profissões já existentes. Esclareceu, à época, o Ministro:
Foi por isso que, ao dirimir conflito de capacitação entre fisioterapeutas, de um lado, e médicos fi siatras de outro, o Supremo Tribunal, dando pela habilitação de ambas as classes, ao invés de extirpar nos artigos 3º e 4º do Decreto-lei nº 938-69, a palavra “privativa”, deu-lhe a interpretação julgada conforme à Constituição, ou seja, a de que não se aplicava a expressão aos médicos especialistas no setor.
Como se verifica, em harmonia com os primados da mínima intervenção estatal, os vetos guardam coerência com as melhores lições do Direito Administrativo.
Espera-se, e é direito nosso, como cidadãos, ter esperanças, na melhoria permanente da qualidade legislativa. E, também, que o parlamento passe a ocupar o nobre espaço que lhe é reservado no regime democrático de representar a sociedade brasileira, no seu melhor quilate.
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1 BRASIL. Lei nº 13.802, de 10 de janeiro de 2019. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano 157, nº 08, p. 02, 11 jan. 2019.
Para saber mais, consulte a obra: BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Organização de textos e índices por J. U. JACOBY FERNANDES. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2019.