As exigências mínimas para a habilitação são definidas genericamente pelo legislador no que se refere aos limites máximos da discricionariedade. Na aplicação da norma, as exigências de habilitação variam de licitação para licitação, de objeto para objeto, de acordo com o prudente arbítrio do gestor.
As exigências mínimas para a habilitação são definidas genericamente pelo legislador no que se refere aos limites máximos da discricionariedade. Na aplicação da norma, as exigências de habilitação variam de licitação para licitação, de objeto para objeto, de acordo com o prudente arbítrio do gestor.
Em relação a essas exigências, é oportuno aqui destacar a exigência da Classificação Nacional de Atividades Econômicas — CNAE das empresas licitantes. Mas, o que seria CNAE?
A CNAE é uma classificação usada com o objetivo de padronizar os códigos de identificação das unidades produtivas do país nos cadastros e registros da administração pública nas três esferas de governo, em especial na área tributária, contribuindo para a melhoria da qualidade dos sistemas de informação que dão suporte às decisões e ações do Estado, possibilitando, ainda, a maior articulação intersistemas. A definição e atualização das subclasses são atribuições da Subcomissão Técnica para a CNAE – Subclasses , organizada no âmbito da CONCLA, sob a coordenação de representante da Secretaria da Receita Federal e com a participação de representantes da administração tributária das esferas estadual e municipal e do IBGE.1
Em face dessa orientação, tem-se que a CNAE é a classificação nacional de atividade econômica composta de dígitos, que descrevem qual é a atividade econômica prestada pela empresa.
Esse tema está intimamente ligado às licitações públicas, uma vez que alguns editais de licitação vêm exigindo a apresentação da CNAE para comprovar que a licitante atua ou é especializada no ramo de atividade pertinente ao objeto da licitação. A Lei nº 8.666/1993, no § 9º do art. 22, exige a pertinência entre o objeto licitado e o ramo de atividade, o que justifica essa exigência editalícia.
Ocorre que, repetidamente, surgem questionamentos quanto à legalidade de exclusão de empresa com o fundamento de que a CNAE da empresa vencedora ou participante não era específica como solicitado pelo edital de licitação.
Diante disso, é necessário pontuar que, pode-se interpretar que restringir a participação do licitante pelo motivo de ausência da CNAE específica fere o princípio da competitividade.
O edital pode prever exigências em consonância com os arts. 27 e seguintes da Lei de Licitações e Contratos. Vedações sem motivação baseada em interesse público, no entanto, não podem ocorrer. A Administração Pública deverá ter ponderação ao exigir as condições para habilitar, de modo que sejam estritamente necessárias para assegurar uma prestação de serviço adequada.
Para corroborar as observações, apresenta-se o Acórdão nº 1203/2011 do TCU. Nesse caso, ocorreu o impedimento de participação de empresa apenas porque seu cadastro na Receita Federal do Brasil apontava atividade não pertinente à atividade licitada, embora houvesse grande proximidade entre ambas.
O relator do processo na análise argumentou o seguinte:
Impedir que uma empresa participasse do certame com base nesse detalhe cadastral é levar a norma extravagante a limites muito além do necessário e diminuir a competitividade do certame, o que configura irregularidade grave. Além disso, e principalmente, a empresa […] apresentou seu Contrato Social onde fica bastante claro que atua no ramo de transporte de passageiros e de cargas.
Entendemos que o cadastro de atividades na Receita Federal do Brasil não é motivo suficiente para impedir a participação da empresa, ainda mais que tal cadastro não era totalmente discrepante do objeto do certame. É certo que esse cadastro é uma imposição legal e deve estar atualizado, porém em nenhum momento há previsão legal de impedir uma empresa de participar em virtude de uma discrepância desse cadastro.
Caberia aos responsáveis a formação de juízo crítico com base em todas as informações apresentadas, especialmente a simples leitura do Contrato Social da empresa representante. Com base nessas informações, e considerando que em licitação as disposições editalícias devem ser interpretadas a fim de garantir a competitividade do certame, conforme preceitua o parágrafo único, art. 4º, Anexo I, Decreto nº 3.555/2000, não haveria motivos para impedir a participação da empresa Dantas, como acabou por ocorrer.2
Corrobora o entendimento da Corte de Contas o Acórdão nº 42/2014 — Plenário, que ressaltou em um dos seus excertos o seguinte:
Considerando que diante do decidido no precedente Acórdão 1.203/2011 – Plenário, segundo o qual o CNAE não deveria, sozinho, constituir motivo para a inabilitação em processo licitatório, havendo outros meios de comprovação da compatibilidade do ramo de atuação da empresa com o objeto da licitação, a exemplo o contrato social, o Relator determinou a realização de diligência ao Senac/MG, com vistas à obtenção de cópia do contrato social da licitante vencedora da licitação, bem assim, objetivando o envio de outras informações[…].3
No mesmo sentido, a Receita Federal já deu entendimento de que o objeto social da empresa deve prevalecer sobre o código da CNAE:
EMENTA: SIMPLES NACIONAL. OPÇÃO. INDEFERIMENTO. ATIVIDADE VEDADA. PREVALÊNCIA DO OBJETO SOCIAL SOBRE O CÓDIGO DA CNAE. O objeto social, para efeito de certificação da atividade econômica explorada, prevalece sobre o código da CNAE. É insubsistente o Termo de Indeferimento de Opção pelo Simples Nacional apoiado numa suposta base fática anunciada neste último, quando o objeto social aponta para outra realidade.4
Diante disso, ressalta-se que não haveria a priori lesão e motivo para a exclusão da empresa por não apresentar todas as informações sobre a sua CNAE. Além disso, a empresa também poderá comprovar que possui especialização no ramo da atividade licitada por meio do seu contrato social.
1 O que é CNAE. Portal da Fazenda/PR. Disponível em: <http://subcomissaocnae.fazenda.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=1>. Acesso em: 22 fev. 2016.
2 TCU. Processo TC nº 010.459/2008-9. Acórdão nº 1203/2011 – Plenário. Relator: Ministro José Múcio Monteiro.
3 TCU. Processo TC nº 029.380/2013-8. Acórdão nº 42/2014 – Plenário. Relator: Ministro Augusto Sherman.
4 Delegacia da Receita Federal de Julgamento em Porto Alegre – 6ª Turma. Portal Fazenda do Governo Federal. Disponível em: <http://decisoes.fazenda.gov.br/netacgi/nph-brs?d=DECW&f=G&l=20&n=-DTPE&p=48&r=952&s1=&s2=6&s4=&u=/netahtml/decisoes/decw/pesquisaDRJ.htm>. Acesso em: 22 fev. 2016.