
por J. U. Jacoby Fernandes e Murilo Jacoby Fernandes
A Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF representou um marco na Administração Pública brasileira, pois proporcionou mudança na condução das atividades administrativas ao impor uma cultura de responsabilidade junto aos gestores para que houvesse mais controle de despesas e receitas. O equilíbrio fiscal promovido pela Lei e os resultados que o País colheu diante da nova postura decorreram, também, da contribuição dos tribunais de contas, que fiscalizam a aplicação e o cumprimento da LRF.
Alguns temas relativos à gestão pública, porém, precisam ser analisados com maior atenção, principalmente no encerramento do ano e, consequentemente, do exercício financeiro. Isso porque, ao final do exercício, pode ocorrer que nem todas as despesas empenhadas naquele ano tenham completado o ciclo − liquidação e pagamento −, ficando, assim, pendentes. Ou seja, recursos devidos pela Administração Pública que ainda não tenham sido pagos.
Surge aí um problema para a contabilidade, pois a despesa foi empenhada no orçamento de um exercício, mas não foi paga, ou porque nem chegou a ser liquidada − empenhos não processados −, ou porque, embora liquidada, não houve tempo suficiente entre a liquidação e o término do exercício para ordenar o pagamento − empenhos processados, mas não pagos. É importante lembrar que a própria LRF impõe limitações para a contração de obrigações que não possam ser pagas no mesmo exercício financeiro.
Surge, também, um problema para os fornecedores que, embora tenham fornecido os insumos para a Administração, não obtiveram o pagamento, o que somente deverá ser realizado no próximo exercício financeiro. E isso não deve sair do campo de visão dos fornecedores. Se há dinheiro a receber, é importante que este seja pago no mesmo exercício financeiro do empenho.
Caso a Administração Pública não pague no exercício financeiro, esses recursos devem ser necessariamente inscritos em restos a pagar. A cautela é necessária, considerando que podem ocorrer problemas supervenientes − referentes ao decréscimo da arrecadação, por exemplo −, que impliquem não haver recursos financeiros para pagar determinadas despesas regularmente empenhadas.
Os restos a pagar, portanto, representam os valores das despesas empenhadas e não pagas até o final do exercício em que ocorreu o empenho. Inscrever em restos a pagar implica manter, no exercício, uma dívida com efeitos no exercício seguinte. Esses valores necessitam ser contabilizados e apropriados, conforme regras próprias, há muito tempo definidas na Lei nº 4.320, de 17 de março 1964.
Mesmo com toda a norma legal e as determinações da LRF para a inscrição do débito em restos a pagar, caso o gestor não o faça por qualquer motivo, o fornecedor possui o meio judicial para buscar os recursos. Aquele que forneceu os produtos e é lesado, seja por desídia ou por má-fé do responsável pelos atos administrativos, pode, por meio judicial, obter a inscrição de seu crédito nos restos a pagar, garantindo o direito de recebê-lo por meio dos recursos do orçamento do exercício financeiro seguinte.
Se tal hipótese não fosse possível, estar-se-ia institucionalizando o calote administrativo, causando grave lesão aos fornecedores e provocando uma insegurança para aqueles que fornecem insumos à Administração Pública. A busca pela assistência jurídica especializada, nessas situações, deve ser o caminho para a garantia dos direitos.