por J. U. Jacoby Fernandes
No Informativo Fórum-Jacoby de ontem, destacamos recente manifestação do Tribunal de Contas da União – TCU acerca da responsabilização do agente público. Destacou-se que, embora as esferas administrativa, civil e penal sejam independentes, as penalidades de cada uma das esferas de competência podem se cumular. A responsabilidade administrativa do servidor, entretanto, deve ser afastada no caso de absolvição civil ou criminal que negue a existência do fato ou a autoria.
O TCU reforçou esse entendimento por meio de acórdão que assim tratou da matéria:
A absolvição criminal pelo reconhecimento da inexistência do fato impõe o afastamento do débito no âmbito do TCU e o consequente arquivamento da tomada de contas especial, sem julgamento de mérito, por ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo (art. 212 do Regimento Interno do TCU).1
Para o ministro Augusto Sherman Cavalcanti, relator do processo no TCU, ainda que a sentença tenha mencionado a ausência de provas, a absolvição criminal pela inexistência do fato importa limitação ao princípio da independência das instâncias e é capaz de vincular as decisões do TCU. Diante da manifestação do TCU, alguns pontos devem ser destacados.
A independência das esferas judicial, penal, civil e jurisdicional de contas é amplamente aceita em nosso ordenamento jurídico. Não se pode, entretanto, confundir a absolvição do crime com a absolvição no julgamento da irregularidade das contas, o que é bastante distinto. No caso discutido no TCU, a absolvição se deu por inexistência do fato, situação em que não se poderia falar em materialidade.
Há casos distintos. Um agente, por exemplo, pode ser condenado em contas irregulares, mas o crime de peculato não ficar caracterizado pela ausência dos elementos do tipo, como o dolo. Conforme destaca Athos Gusmão Carneiro, um dos mais cultos ministros que já passou pelo Superior Tribunal de Justiça:
As atribuições do Tribunal de Contas são de natureza administrativa. Entretanto, quando “julga ‘as contas’ dos administradores e demais responsáveis por bens e valores públicos”, tal julgamento impõe-se ao Poder Judiciário no que concerne ao aspecto contábil, sobre a regularidade da própria conta; o julgado do Tribunal de Contas constitui prejudicial no juízo penal, como apuração da qual o juiz não pode se afastar, de elemento de fato necessário à tipicidade do crime (José Cretella Junior, Tribunais de Contas, Dicionário, cit. Seabra Fagundes, O controle, cit. n. 62). Da mesma forma, tal julgado impõe-se na ação de ressarcimento promovida contra o responsável pelo alcance.2
Em relação à Tomada de Contas Especial, porém, a decisão da esfera penal só tem repercussão na esfera administrativa quando aquela se manifesta pela inexistência material do fato ou pela negativa da autoria, como no caso acima destacado3. Confirmando o exposto, deliberou o Superior Tribunal de Justiça:
Com a manifestação, o STJ reforma as situações em que as Cortes de Contas terão o princípio da independência mitigado em razão de absolvição em instância diversa da administrativa.
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1 TCU. Processo nº 033.676/2012-7. Acórdão nº 10939/2018 – Primeira Câmara. Relator: ministro Augusto Sherman.
2 CARNEIRO, Athos Gusmão. Jurisdição e competência. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 14.
3 Nesse sentido: Tribunal de Contas da União. Tomada de Contas Especial. Processo TC nº 004.014/2002-0. Acórdão nº 378/2004 – 2ª Câmara. Relator: Ministro Licoln Magalhães da Rocha, Brasília, 18 de março de 2004. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 29 mar. 2004.
4 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus nº 88.370/RS – 5. Turma. Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Brasília, 7 de outubro de 2008. Diário da Justiça Eletrônico