Com o advento da Lei Complementar nº 135, de 4 de junho de 2010, que alterou a Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990, o país celebrou a aprovação da figura que foi denominada de “ficha limpa”. É preciso analisar os fatos envolvidos na questão.
por Alveni Lisboa
Senadores tem se mobilizado para tentar aprovar, em regime de urgência, o projeto que flexibiliza a Lei da Ficha Limpa. Ontem, parlamentares contrários ao projeto discordaram do pedido de urgência e a proposta deverá ser analisada hoje. O PLS nº 396/2017, do senador Dalírio Beber, altera o período de inelegibilidade para políticos condenados por abuso de poder econômico pela Justiça Eleitoral após 2010 para apenas três anos.
O texto foi apresentado em outubro de 2017, pouco tempo após o Supremo Tribunal Federal – STF determinar que os sentenciados deveriam cumprir oito anos de inelegibilidade, e não três, como ocorria anteriormente. O tribunal também discutia se a punição determinada pela Lei da Ficha Limpa, que entrou em vigor em 2010, valeria também para casos anteriores a essa data. Por maioria de seis votos, os ministros entenderam que sim.
Ao sugerir as alterações, o autor justificou que a punição de oito anos “penaliza” a cidadania. “Um tal aumento configura, de modo inequívoco, um claro exemplo de retroatividade de lei nova para conferir efeitos mais gravosos a fatos já consumados”. Já os contrários entendem que a proposta abre as portas para beneficiar políticos condenados, já que permitiria a candidatura no próximo pleito. O projeto ainda precisa de parecer da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania –CCJ, o que deve ocorrer em plenário.
Comentários do professor Jacoby Fernandes: com o advento da Lei Complementar nº 135, de 4 de junho de 2010, que alterou a Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990, o país celebrou a aprovação da figura que foi denominada de “ficha limpa”. É preciso analisar os fatos envolvidos na questão.
Primeiro, nenhuma pena pode retroagir, mas juridicamente pode ter seus efeitos postergados. Aplicando esses princípios ao caso concreto, não se pode colocar uma pena adicional de impedir à participação nas eleições, aos que foram condenados antes da vigência da norma; mas é lícito que a norma estabeleça que só terá efeitos a partir de tal data.
Segundo, a previsão da pena visa dissuadir, desmotivar uma pessoa a praticar determinado ato. Assim, a norma deve ser conhecida por todos, previamente.
Terceiro, uma boa norma deve prever meios adequados à reparação dos danos causados, sempre que possível, independentemente de a pena ser cumprida.
Quarto, também uma boa norma, deve considerar a possibilidade de reabilitação do agente infrator, após determinado lapso temporal. É o desejo mais nobre da humanidade: a melhoria do ser humano, sempre que possível for a reabilitação.
Quinto, e talvez o mais importante. Uma norma só alcançará esses propósitos se for aplicada imediatamente.
Percebe-se, portanto, que ao contrário da cortina de fumaça apresentada para a sociedade – lei retroagir, beneficiar
infratores, e outras manchetes expostas na convidativa vitrine dos moralistas, tem-se um grave problema estrutural: imperiosa necessidade de julgamento célere.
O mesmo problema estrutural está sendo esquecido, quando se combatem as regras de prescrição. Não é possível, como aconteceu recentemente, recolher à prisão um agente para cumprir pena de cinco anos, depois de dezenove anos da ocorrência dos fatos. Não será eliminando a prescrição ou acusando advogados que se resolverá esse problema estrutural.
Por fim, deve-se lembrar que a Lei da ficha limpa tem uma finalidade essencial à democracia: melhorar a qualificação dos candidatos. Mais, ainda, quando retira do sufrágio os que cometeram crimes eleitorais e financeiros obtém-se maior efetividade na isonomia.
Com informações da Agência Brasil.