Aponto com clara preocupação a perda da validade da Medida Provisória nº 868/2018 que promovia a reformulação das contratações no setor de saneamento básico. O decurso do tempo, a falta de articulação política e a omissão do Poder Legislativo em apreciar o texto impediu que avanços fossem promovidos no ordenamento jurídico brasileiro.
Diante da caducidade da medida provisória, o senador Tasso Jereissati apresentou, no início da semana passada, o Projeto de Lei nº 3.261/2019, que retoma pontos previstos no texto da MP 868, com o objetivo de modernizar o marco regulatório de saneamento básico. Na verdade, o projeto reproduz o texto da MP e agrega emendas apresentadas na Comissão Mista criada para analisar a matéria no parlamento. Na justificativa da proposta, assim destaca o senador:
O modelo institucional do setor precisa ser otimizado de modo a superar os graves índices hoje observados no Brasil. Cerca de 35 milhões de brasileiros não têm acesso a água tratada. Metade da população, em torno de 104 milhões de pessoas, não têm acesso aos serviços de coleta de esgoto. Do esgoto coletado, apenas 42% são tratados. São dados graves, que dificultam a melhoria dos índices de desenvolvimento humano (IDH) e trazem sérios prejuízos sociais e econômicos a diversos setores produtivos, retardando o desenvolvimento da nação.1
O Senado já aprovou o regime de urgência da tramitação da matéria na Casa. O texto facilita a participação da iniciativa privada nos serviços de saneamento. A norma dispõe:
Art. 10-A. Os contratos relacionados à prestação dos serviços de saneamento básico conterão as cláusulas essenciais previstas no art. 23 da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, além das seguintes disposições:
I – metas de expansão dos serviços, de redução de perdas na distribuição de água tratada, de qualidade na prestação dos serviços, de eficiência e de uso racional da água, da energia e de outros recursos naturais, do reúso de efluentes sanitários e do aproveitamento de águas de chuva em conformidade com os serviços a serem prestados;
II – possíveis fontes de receitas alternativas, complementares ou acessórias, bem como as provenientes de projetos associados, cujas receitas poderão ser compartilhadas entre o contratante e o contratado, caso aplicável;
III – metodologia de cálculo de eventual indenização relativa aos bens reversíveis não amortizados quando da extinção do contrato; e
IV – repartição de riscos entre as partes, inclusive os referentes a caso fortuito, força maior, fato do príncipe e álea econômica extraordinária.1
O trecho acima será incluído na Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007, que estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico. O trecho também inclui como princípio fundamental dos serviços de saneamento a seleção competitiva do prestador dos serviços e a prestação regionalizada dos serviços, com vistas à geração de ganhos de escala e à garantia da universalização e da viabilidade técnica e econômico-financeira dos serviços.
Sabe-se que buscar recursos na iniciativa privada exige segurança jurídica. Por isso, as mudanças nas regras são essenciais para o sucesso do novo sistema de saneamento, considerando que transferir o pagamento do serviço para os particulares exige uma engenharia econômica, pois é precisamente a classe menos favorecida que será onerada com o pagamento.
O atraso no sistema de saneamento não pode continuar. O país não pode se dizer desenvolvido quando muitos de seus cidadãos não tem acesso a água tratada ou ao esgoto. O projeto traz uma interessante proposta para superar esses desafios.
1 BRASIL. Senado Federal. Projeto de Lei nº 3.261, de 2019. Disponível em: https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/137118. Acesso em: 10 jun. 2019.