
por J. U. Jacoby Fernandes
O princípio da motivação é intrínseco ao Poder Judiciário, sendo um dever de ofício dos juízes apresentar, em suas sentenças, a fundamentação e os motivos que o levaram a chegar àquela conclusão. Ao tratar dos elementos essenciais da sentença, o Código de Processo Civil assim preceitua:
Art. 489. […]
1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:
I – se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;
II – empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;
III – invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;
IV – não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;
V – se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;
VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.1
A motivação, no âmbito judicial, representa uma garantia ao jurisdicionado de que a autoridade cotejou os argumentos da defesa e da acusação antes da tomada de decisão. O princípio também está presente na Lei nº 9.784/1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. A lei destaca que “a Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência”. Nos processos administrativos, portanto, serão observados, entre outros, os critérios de indicação dos pressupostos de fato e de direito que determinarem a decisão.
A Lei nº 13.655/2018 tornou o princípio da motivação ainda mais evidente para todos aqueles que atuam com os processos administrativos. O texto preceitua:
Art. 20. Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão.
Parágrafo único. A motivação demonstrará a necessidade e a adequação da medida imposta ou da invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, inclusive em face das possíveis alternativas.2
Coube, porém, ao Decreto nº 9.830/2019, que regulamentou os trechos incluídos na Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro – LINDB em razão da aprovação da Lei nº 13.655/2018, estabelecer quais requisitos devem ser observados na motivação das decisões. O Decreto, publicado essa semana no DOU, instituiu importante regra acerca das motivações baseadas em valores jurídicos abstratos. O texto dispõe:
Art. 3º A decisão que se basear exclusivamente em valores jurídicos abstratos observará o disposto no art. 2º e as consequências práticas da decisão.
1º Para fins do disposto neste Decreto, consideram-se valores jurídicos abstratos aqueles previstos em normas jurídicas com alto grau de indeterminação e abstração.
2º Na indicação das consequências práticas da decisão, o decisor apresentará apenas aquelas consequências práticas que, no exercício diligente de sua atuação, consiga vislumbrar diante dos fatos e fundamentos de mérito e jurídicos.3
Por ser dotada de natural subjetividade na interpretação, as decisões baseadas em valores jurídicos abstratos exigem balizas para que o intérprete possa atuar para a busca pela melhor solução para o caso. O decreto, nesse sentido, destaca que a motivação dos atos demonstrará a necessidade e a adequação da medida imposta, “inclusive consideradas as possíveis alternativas e observados os critérios de adequação, proporcionalidade e de razoabilidade”.
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1 BRASIL. Lei nº 13.655, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 12 jun. 2019
2 BRASIL. Decreto-Lei nº 4.657, de 04 de setembro de 1942. Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del4657compilado.htm. Acesso em: 11 jun. 2019